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ESTADO DO AMAPÁ
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA

Referente ao Projeto de Lei nº 0039/97-AL

LEI Nº 0388, DE 10 DE DEZEMBRO DE 1997

Publicada no Diário Oficial do Estado nº 1708, de 12.12.97

Autor: Deputada Janete Capiberibe

Dispõe sobre os instrumentos de controle do acesso à biodiversidade do Estado do Amapá e dá outras providências.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAPÁ,

Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado do Amapá decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I
Das Disposições Gerais

Art. 1º Incumbe ao Poder Executivo preservar a diversidade, a integridade e a utilização sustentável dos recursos genéticos localizados no Estado do Amapá e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético, atendidos os seguintes princípios:

I - inalienabilidade dos direitos sobre a diversidade biológica e sobre os recursos genéticos existentes no território do Estado do Amapá;

II - participação das comunidades locais e dos povos indígenas nas decisões que tenham por objetivo o acesso aos recursos genéticos nas áreas que ocupam;

III - participação das comunidades locais e dos povos indígenas nos benefícios econômicos e sociais decorrentes dos trabalhos de acesso a recursos genéticos localizados no Estado do Amapá;

IV - proteção e incentivo à diversidade cultural, valorizando-se os conhecimentos, inovações e práticas das comunidades locais sobre a conservação, uso, manejo e aproveitamento da diversidade biológica e genética.

Art. 2º O controle e a fiscalização do acesso aos recursos genéticos visam à proteção, à conservação e à utilização sustentável do patrimônio natural do Estado do Amapá, aplicando-se as disposições desta Lei a todas as pessoas físicas e jurídicas que extraiam, usem, aproveitem, armazenem, comercializem, liberem ou introduzam recursos genéticos no Estado do Amapá.

Art. 3º Esta Lei aplica-se aos recursos biológicos e genéticos continentais, costeiros, marítimos e insulares presentes no Estado do Amapá.

Art. 4º Esta Lei não se aplica:

I - ao todo, a suas partes e aos componentes genéticos dos seres humanos;

II - ao intercâmbio de recursos biológicos realizado pelas comunidades locais e pelos povos indígenas, entre si, para seus próprios fins e baseados em sua prática costumeira.

CAPÍTULO II
Das Atribuições Institucionais

Art. 5º Para assegurar o cumprimento do disposto nesta Lei, o Poder Executivo deverá:

I - criar comissão composta por representantes do Governo Estadual, dos municípios, da comunidade científica e de organizações não governamentais, com o objetivo de coordenar, avaliar e assegurar o desenvolvimento das atividades de preservação da diversidade e da integridade do patrimônio genético do Estado do Amapá, valendo-se da colaboração das empresas privadas;

II - elaborar as diretrizes técnicas e cientificas para o estabelecimento de prioridades para a conservação de ecossistemas, espécies e gens, baseadas em fatores como o endemismo, a riqueza e o inter-relacionamento de espécies e seu valor ecológico e, ainda, nas possibilidades de gestão sustentável;

III - desenvolver planos, estratégias e políticas para conservar a diversidade biológica e assegurar que o uso dos seus elementos seja sustentável;

IV - estimular a criação e o fortalecimento de unidades de conservação, a fim de conservar espécies, habitats, ecossistemas representativos e a variabilidade genética dentro das espécies; e,

V - capacitar pessoal para proteger, estudar e usar a biodiversidade;

CAPÍTULO III
Do Acesso aos Recursos Genéticos

Art. 6º Os trabalhos de levantamento e de coleta de recursos da diversidade biológica realizados no território do Estado do Amapá deverão ser previamente autorizados pela autoridade competente, após apresentação de requerimento pela pessoa física ou jurídica solicitante, onde constem, pelo menos:

I - informação detalhada e especificada para a pesquisa dos recursos a que deseja ter acesso, incluindo seus usos atuais e potenciais, sua sustentabilidade e os riscos que possam decorrer do acesso;

II - descrição circunstanciada dos métodos, técnicas, sistemas de coleta e instrumentos a serem utilizados;

III - localização precisa das áreas de acesso aos recursos;

IV - indicação do destino do material coletado e seu provável uso posterior.

Art. 7º Os trabalhos referidos no artigo anterior deverão, obrigatoriamente, contar com o acompanhamento de instituição técnico-científica brasileira de reconhecido conceito na área objeto de pesquisa, especialmente designada para tal pela autoridade competente.

Parágrafo único. A instituição designada responde solidariamente pelo cumprimento das obrigações assumidas pela pessoa física ou jurídica autorizada ao desenvolvimento dos trabalhos.

Art. 8º A autorização emitida pela autoridade competente deverá conter, além das informações prestadas pelo solicitante, todas as demais obrigações a serem cumpridas, destacando-se:

I - submissão a todas as demais normas nacionais, em especial as de controle sanitário, de biossegurança, de proteção do meio ambiente e aduaneiras;

II - garantia de participação estadual e nacional nos benefícios econômicos, sociais e ambientais dos produtos e processos obtidos pelo uso dos recursos genéticos encontrados no território do Estado do Amapá;

III - garantia do depósito obrigatório de um espécime de cada recurso genético acessado;

IV - asseguração às comunidades tradicionais, indígenas, entre outras, da remuneração por acesso aos direitos intelectuais coletivos, que se darão na forma especificada no contrato de acesso, sem que isso represente qualquer tipo de transferência sobre o controle do conhecimento.

Art. 9º Caberá à autoridade competente, em conjunto com a instituição designada para o acompanhamento dos trabalhos autorizados, acompanhar o cumprimento dos termos da autorização e, particularmente, assegurar que:

I - o acesso seja feito exclusivamente às espécies autorizadas;

II - sejam conservadas as condições ambientais da região onde se desenvolvem os trabalhos;

III - haja permanentemente a participação direta de um especialista da instituição supervisora;

IV - seja feito um informe detalhado das atividades realizadas e do destino das amostras coletadas;

V - tenha sido entregue um espécime da amostra coletada para ser conservado ex situ.

Parágrafo único. A autoridade competente poderá adicionalmente, caso julgue necessário, exigir a apresentação do estudo de impacto ambiental decorrente dos trabalhos a serem desenvolvidos.

Art. 10. As pessoas físicas ou jurídicas autorizadas a desenvolver trabalhos de acesso aos recursos genéticos brasileiros ficam obrigadas a comunicar às autoridades competentes quaisquer informações referentes ao transporte de espécimes coletados, sendo também responsáveis civil, penal e administrativamente pelo inadequado uso ou manuseio de tais espécimes e pelos efeitos adversos na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica.

Art. 11. A autorização para acesso aos recursos genéticos não implica autorização para sua remessa ao exterior, a qual deverá ser previamente solicitada e justificada à autoridade competente.

Art. 12. É ilegal o uso de recursos genéticos com fins de pesquisa, conservação ou aplicação industrial ou comercial que não conte com o respectivo certificado de acesso.

Art. 13. Não se reconhecerão direitos sobre recursos genéticos obtidos ou utilizados em descumprimento desta Lei, nexo se considerando válidos títulos de propriedade intelectual ou similares sobre tais recursos ou sobre produtos ou processos resultantes do acesso em tais condições.

Art. 14. A introdução de espécimes e de recursos genéticos no Território do Estado do Amapá dependerá de prévia autorização e obedecerá às seguintes diretrizes:

I - A introdução de um espécime exótico só será admitida se dela se puderem esperar benefícios evidentes e bem definidos para as comunidades locais;

II - A introdução de um espécime exótico só será admitida se não houver tecnologia adequada para utilização de espécies nativas para o mesmo fim, e para auxiliar na preservação de espécies nativas;

III - Nenhum espécime exótico poderá ser deliberadamente introduzido em qualquer habitat natural, entendendo-se como tal aquele que não tenha sido alterado pelo homem, sem os prévios estudos de impacto ambiental;

IV - Nenhum espécime exótico poderá ser introduzido em habitats seminaturais, exceto quando a operação houver sido submetida a prévio estudo de impacto ambiental;

V - A introdução de espécimes exóticos em habitats altamente modificados só poderá ocorrer após os seus efeitos sobre os habitats naturais e seminaturais terem sido avaliados por meio de prévio estudo de impacto ambiental.

CAPÍTULO IV
Do Desenvolvimento e Transferência de Tecnologia 

Art. 15. O Poder Público promoverá e apoiará o desenvolvimento de tecnologias nacionais sustentáveis para o uso e melhoramento de espécies, estirpes e variedades autóctones e dará prioridade aos usos e práticas tradicionais dentro dos territórios das comunidades locais, de acordo com suas aspirações.

Parágrafo único. Para os fins deste artigo, o Poder Público promoverá o levantamento e avaliação das biotecnologias tradicionais e locais.

Art. 16. Será permitida a utilização de biotecnologias estrangeiras, sempre e quando estas se submetam a esta Lei e demais normas sobre biossegurança, e a empresa pretendente assuma integralmente a responsabilidade por qualquer dano que possa acarretar à saúde, ao meio ambiente ou às culturas locais, no presente e no futuro.

CAPÍTULO V
Das Sanções Administrativas

Art. 17. O Poder Executivo estabelecerá em regulamento o sistema de sanções administrativas que se aplicarão aos infratores desta Lei, entre as seguintes:

I - admoestação por escrito;

II - apreensão preventiva do recurso coletado, assim como de materiais e equipamentos utilizados na ação irregular;

III - multa diária cumulativa;

IV - suspensão da permissão ou licença para acesso ao recurso;

V - revogação da permissão à licença para acesso ao recurso;

VI - apreensão definitiva do recurso coletado, dos materiais e equipamentos utilizados na ação irregular.

Parágrafo único. As sanções estabelecidas neste artigo serão aplicadas sem prejuízo de ações civis ou penais cabíveis.   

CAPÍTULO VI
Das Disposições Finais

Art. 18. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 19. Revogam-se as disposições em contrário.

Macapá - AP, 10 de dezembro de 1997.

JOÃO ALBERTO RODRIGUES CAPIBERIBE
Governador